Contos de fada ensinam conformismo?


Quando estava pesquisando o post sobre mundos paralelos, percebi uma coisa que todos os mundos paralelos tinham em comum: todos eram horríveis.

Essa é uma trope comum em mídias seriais, como por exemplo, sitcoms & dramas de scifi. Quando visitamos um mundo diferente do nosso, é importante mostrar como nosso mundo, aquele que a série habita usualmente, é melhor em comparativo.

Contudo, ao montar minha lista de mundos de fantasia para o post
número 50, percebi a mesma trend. Os mundos de fantasia como Oz, Wonderland e Neverland parecem todos lugares incríveis de início, mas ao final, chegamos à conclusão de que "não existe lugar melhor que nosso lar".
 

Achei isso intrigante, até por que, diferente de seriados, que são mídias contínuas, essas histórias eram cenários fechados, destinados a serem consumidos uma só vez. Ou seja, não havia problema em amarmos Oz, pois essa seria apenas uma visita, e não teríamos o comparativo de outros episódios passados no Kansas por exemplo. 

Histórias como essas tem como objetivo ensinar uma lição ao público, e são chamadas de Fábulas. 

Fábulas (do Latim fabula: história, jogo ou narrativa), são composições literárias curtas, escritas em prosa ou versos em que os personagens são animais que apresentam características antropomórficas, muito presente na literatura infantíl. As fábulas possuem caráter educativo e fazem uma analogia entre o cotidiano humano com as histórias vivenciadas pelas personagens, essa analogia é chamada de moral e geralmente é apresentada no fim da narrativa.

Então, quando conto após conto se destina a comparar a realidade como ela existe contra um mundo de fantasia, mostrando o quanto o segundo é ruim, percebemos que estamos sendo "ensinados" algo. 

Nesse caso, estamos sendo ensinados conformidade. Quando a conformidade se dá por submissão, consciente ou inconsciente, é usual dizer-se que ocorreu uma situação de conformismo.

Segundo René Mucchielli, o conformismo é a atitude social que consiste em se submeter às opiniões, regras, normas, modelos que representam a mentalidade coletiva ou o sistema de valores do grupo ao qual se adere a torná-los seus.

Krech, Crutchfield e Ballanchey (1962) dizem que para existir conformismo tem de haver conflito. Isto quer dizer que persiste um conflito entre aquilo que um indivíduo deseja e o modo como o grupo ou uma força superior ao indivíduo o pressiona para actuar.

Crianças, cheias de imaginação, idéias e desejos, lêem esses contos em busca de mundos novos à serem descobertos. Contudo, dentro de suas páginas, aprendem que a fantasia não é aquilo que imaginavam. Existe um preço horrível a ser pago por viverem fora do padrão social.

Wendy não quer crescer, mas em Neverland descobre que viver em eterna juventude é "perigoso". Alice acha a sociedade britânica algo opressor, mas aprende no País das Maravilhas que existem lugares piores e mais opressores, com Rainhas loucas. Dorothy procura uma vida "além do Arco-íris", mas percebe que seu lar é o melhor lugar do mundo, e nunca deveria ter saído de lá.

O conformismo se abraça com nossos medos e estes usam a nossa idade ou qualquer outra "fraqueza" como desculpa para aceitarmos o que nos restou, afinal pra que se arrebentar mais ainda mudando de rumo ou tentando alçar voos maiores a essa altura do campeonato?

Essas histórias institucionalizam uma cultura de medo de mudança, e de manutenção de continuidade social.